domingo, 28 de fevereiro de 2016

Irlanda

Fiquei de fazer uma carta, mas percebi que já dei cartas demais, então decidi fazer diferente, fazer fantasia, até porque ambos amamos um mundo que não o nosso. Tudo começa com um trevo, verde, pequeno, frágil, porém mágico. Eu conseguia ver a aura ao redor das folhas, das quatro folhas, brilhando forte, intensamente. Que sorte a minha, achar um trevo de quatro folhas na quadra de uma escola.

Guardei o achado, me dava esperanças de um ótimo ano. Porém, ao guardar um simples perdido da natureza, acabei libertando algo, acabei me libertando e quando percebi já estava na Irlanda. Ouvia músicas instrumentais, como as da idade média, apreciava os sons da natureza e brincava com as criaturas mágicas. 

Segui uma fada, muito bonita, por acaso, até um arco iris, belo, colorido, reluzente. Não era como os arco iris que vemos aqui na vida real, era próximo, era tocável, era meu. E no fim dele, um pote de ouro, com um duende sentado. "Que sorte a minha", pensei. Eu tinha tudo aquilo em um só lugar. Por que alguém tão comum como eu teve aquela chance?

Nasci na luz, como toda criança, mas cresci sendo perseguido. Nem tudo é bolo de aniversário, algumas coisas são balões estourados. Fui atormentado por grande parte da vida, tive minha vivência alterada, até me tornar o que sou. Quer dizer, o que eu era naquela época, pois hoje estou diferente. Mas ao chegar na Irlanda, eu era coisa ruim, afetado pela escuridão, era amado pelo ódio e odiado por quem me amava.

Aquele local encantado, ah, ele mudou minha vida, me devolveu a luz. Me lembro de cada ensinamento que obtive ali, desde o de perdoar as pessoas que me fizeram mal até o de aceitar o amor de quem me faz bem. E fui crescendo na Irlanda, meu local favorito, cresci por ano e uns meses, mas voltaram para me buscar.

Eu não queria ir embora e nem queria destruir meu local favorito, mas todos que me conhecem sabem que aquele não era meu lugar, né? Meu lugar era entre os cruéis, de toda parte do mundo. Vi uma Deusa querendo me ajudar, como era bela. Não pertencia àquele lugar, era de ilhas pouco mais ao sul, mas estava ali, pelo meu bem. Ela foi atacada pelas coisas ruins que vieram por mim e fugiu, deixando cair uma pequena concha. E eu vi o furacão se aproximando, sendo puxando pela bruxa má. Vi os portais do inferno se abrirem, e cavaleiros fantasmas vindo me levar de volta para o pai. Vi as sombras engolindo tudo que eu amava.  

Tentei impedir, dizer que não, mas era tarde demais, eu tinha destruído tudo. Estava de volta para a solidão, teria que me acostumar a ela mais uma vez. E olhei para a Irlanda, agora precisando de uma reforma e não seria eu o responsável por ela, um vez que fui o responsável pelos desastres. Aceitei tudo, decidi seguir em frente, deixar aquela terra, mas não abandoná-la. 

De vez em quando passo perto dali, sinto o cheiro das árvores, escuto o cantar dos pássaros, vejo as criaturas brincando, e sinto vontade de atravessar as fronteiras e voltar para aquele lugar que é tão luz. Entretanto, eu não pertenço mais a ele, não posso arriscar destruir tudo mais uma vez. Então fico assistindo o espetáculo de longe, as vezes sorrindo, outras vezes entre lágrimas, mas nunca esquecendo todos os momentos bons que tive ali. 

Talvez um dia eu volte para a Irlanda, quando eu não for mais um alvoroço, quando eu aprender que não sou totalmente uma coisa ou outra, quando eu me equilibrar. Então eu sentarei no pote de ouro, junto com o duende, no final do arco iris, guiado pela fada, segurando meu trevo de quatro folhas.

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